Em artigo anterior discutimos o que são, onde podem ser encontradas e possibilidades de uso das plantas alimentícias não convencionais (pancs). Neste artigo, pretendemos abordar aspectos da qualidade nutricional das pancs e os benefícios que seu consumo diário, incrementando pratos, proporciona a nossa saúde. Estas espécies incluem maiores quantidades de macro e micronutrientes quando comparadas aos vegetais convencionais? Há diferenças de composição nutricional entre diferentes partes comestíveis de pancs? É importante salientar que diversos fatores ambientais, como tipo de solo, luminosidade, quantidade de água, dentre outros, interferem na qualidade nutricional de tubérculos, folhas, flores e frutos, as partes comestíveis das plantas, sejam elas convencionais ou não convencionais. Cabe citar que aqui o termo pancs também é sinônimo de hortaliças não convencionais ou vegetais não convencionais.
É fato comprovado pela literatura especializada e científica, que o consumo de vegetais na alimentação diária beneficia nossa saúde, especialmente quando pensamos na inclusão das fibras em nossa alimentação. No entanto, os vegetais complementam nossa alimentação também com minerais, vitaminas e diversos compostos bioativos ou nutracêuticos, os quais previnem doenças e impactam na nossa saúde de forma benéfica. As fibras, formadas por açúcares complexos das células vegetais, os quais mesmo não sendo digeridas e absorvidas por nós, nos beneficiam de várias formas, por ativarem nosso intestino, melhorando o trânsito do bolo alimentar, bem como favorecem a permanência de bactérias benéficas no nosso organismo. Cabe salientar, que o consumo de água associado ao de fibras é fundamental para sentirmos os seus benefícios.
Em relação aos minerais, estes podem ser obtidos de produtos naturais de origem animal e vegetal. Até recentemente, minerais não eram reconhecidos como benéficos no tratamento de problemas de saúde, bem como no equilíbrio do metabolismo natural do corpo. No entanto, mais recentemente, órgãos como Organização Mundial da Saúde (OMS) tem enfatizado a importância da manutenção de quantidades adequadas de minerais no organismo para manutenção da saúde. Destaca-se o papel de pelo menos 18 minerais, sendo os principais zinco, cálcio, magnésio, ferro, potássio, manganês, sódio, boro, e as quantidades necessárias de cada um varia na dinâmica de cada sistema corporal. Assim, complementando a alimentação com vegetais diariamente, estaremos incluindo em nosso organismo os minerais necessários ao seu bom funcionamento, sem a necessidade de suplementação, a não ser que esta seja por recomendação médica.
Associado ao consumo de vegetais, também destacam-se os compostos bioativos, que incluem carotenóides, flavonóides, antocianinas, dentre outros e, se incluídos na alimentação diária, trazem diversos benefícios à saúde. Os compostos bioativos são importantes do ponto de vista da prevenção e redução de doenças cardiovasculares e arteriosclerose, pois funcionam como antioxidantes, revertendo lesões artereoscleróticas, atuando na síntese e absorção do colesterol, no controle da pressão arterial, reduzindo processos inflamatórios e fortalecendo o sistema imunológico.
Então, onde entram as pancs ou hortaliças não convencionais? As pancs têm recebido destaque em diversas pesquisas científicas, pois ao serem comparadas com as plantas convencionais, destacam-se pelos altos teores de minerais, vitaminas e compostos bioativos. Diversos estudos vêm mostrando que estas plantas incluem quantidades superiores de minerais como cálcio, potássio, manganês, magnésio, fósforo, ferro, vitaminas C e do complexo B, e que se consumidas diariamente, cruas ou mesmo inseridas em diferentes pratos, podem suprir as necessidades diárias recomendadas destes nutrientes. Cabe salientar que muitas destas espécies são encontradas em terrenos baldios, nas nossas hortas nascendo espontaneamente, nas beiras de estradas, o que lhes confere outra vantagem, além de serem de fácil obtenção e cultivo, ainda podem ser obtidas sem custos. É fundamental saber escolher o local de coleta, evitando locais contaminados com agrotóxicos ou esgotos, bem como higienizá-las adequadamente. Abaixo serão citadas algumas pancs amplamente distribuídas na nossa região, dentre as muitas que existem, e sua qualidade nutricional, como forma de incentivar seu consumo.
O dente-de-leão é uma espécie conhecida e amplamente encontrada em diferentes áreas, como hortas domésticas, bordas de estradas, jardins, entre cultivos diversos no período de outono inverno. As folhas são ricas em diversos minerais e, quando comparadas comparadas com folhas de alface, apresentam pelo menos dez vezes mais proteínas, cálcio, ferro e fósforo. Pode ser degustada em saladas e em diversos pratos.
A bertalha coração é nativa, encontrada em cercas e bordas de matas, é uma espécie considerada hortaliça e, também, é um alimento nutracêutico, rico em ferro (102 mg/Kg), utilizado para tratamento de anemias, além de conter cálcio e zinco, vitamina A e C. Além das folhas nutritivas, também forma túberas aéreas ricas em amido. Além do consumo em saladas, são preparadas farinhas das folhas utilizadas como suplemento alimentar.
Outra espécie conhecida e pouco utilizada é o almeirão do campo ou chicória do campo, uma espécie nativa que apresenta altas concentrações de cálcio (1.000 mg/100g), sódio (620mg/100g), potássio (3.100mg/100g), além de zinco e fósforo. Suas folhas podem ser consumidas in natura, mas também refogadas ou adicionadas a diversos pratos.
A beldroega é uma espécie facilmente encontrada em diferentes locais, inclusive nas calçadas e bordas de estradas, jardins e terrenos baldios, muito negligenciada, no entanto com alto potencial alimentício, sendo também considerada alimento funcional. É, dentre as folhosas, a espécie que apresenta a maior quantidade de ácido linoleico (ômega 3) nas folhas, superando até o óleo de alguns peixes, algas e sementes de linhaça. Além disto, contém vitamina B e C, carotenóides, magnésio, cálcio e potássio.
Ora-pro-nobis, conhecida também como carne-de-pobre, pode ser uma alternativa ao consumo de carne, pois suas folhas apresentam alta concentração de proteínas e em base seca (farinha das folhas) contém 28,4 g de proteínas para cada 100g de farinha de folhas. Em pesquisas recentes foram realizadas comparações das folhas de ora-pro-nobis em base seca e úmida, com alimentos ricos em proteínas, por exemplo o feijão preto que contém 8,8 g/100g e com lentilha 9 g/100g de proteínas. Além disto possui altas concentrações de minerais como zinco, cálcio, fibras, vitamina C, ácido fólico. Suas folhas tem boa digestibilidade e absorção. Podem ser consumidas em saladas, bolos, pães, cupcake, omeletes e uma variedade de pratos.
Constata-se o alto potencial nutricional das pancs, havendo grande diversidade destas espécies em diferentes épocas do ano, portanto é hora de começar a incrementar nossa alimentação consumindo pancs.
Elaine Biondo – Doutora, Professora da Uergs unidade em Encantado, membro da Articulação em Agroecologia do Vale do Taquari (AAVT) e Coordenadora do Núcleo de Estudos em Agroecologia e Produção Orgânica do Vale do Taquari (NEA VT).
Rosiele Lappe Padilha – Doutora, Professora da Uergs unidade em Encantado, Professora e Orientadora do Mestrado Profissional em Ciência e Tecnologia de Alimentos – Uergs Encantado, Vale do Taquari.
Fotos: Elaine Biondo