Experiência educacional em Estrela leva jovens e adultos, que não se conhecem ainda, a trocarem cartas relatando suas experiências e histórias de vida
Mesmo em uma era digital, de mensagens instantâneas e curtas, a tradicional troca de cartas, já considerada arcaica pela maioria, ainda traz excelentes resultados. É o que demonstra o Projeto “Minha Vida em uma Carta”, que tem proporcionado educação através da interação entre alunos de diferentes faixas etárias e contextos sociais, educacionais e, sobretudo, que não se conhecem… ainda. Participam estudantes do programa Educação de Jovens e Adultos (EJA), que reúne pessoas entre 18 e 74 anos, e jovens da escola municipal do interior do município, com média de 10 anos. Através da troca de cartas, os integrantes têm exposto aos desconhecidos interlocutores seus cotidianos e suas experiências de vida. O aguardado encontro, onde irão se conhecer, está marcado para o próximo dia 18.
O projeto é uma iniciativa da educadora Gisele Barbosa, professora da escola do interior, com a participação da professora de Língua Portuguesa da EJA, Caroline Sulzbach. A EJA funciona nas dependências da Escola Municipal de Ensino Fundamental (EMEF) Leo Joas, no Bairro das Indústrias, área urbana do município, e conta hoje com mais de 50 pessoas, algumas das quais até pouco tempo atrás não sabiam nem ler ou escrever. Do outro lado estão 17 estudantes do 5º ano da EMEF Arnaldo José Diel, localizada na Linha Lenz, interior de Estrela, que atende hoje a mais de 195 crianças e jovens do jardim ao 9º ano.
Surpresas
As expectativas eram grandes na Linha Lenz, na última sexta-feira (04). Os alunos da Arnaldo José Diel receberiam cartas dos participantes da EJA. A estudante Eduarda Bairros Alves, 10 anos, foi considerada pela turma como a “premiada”, ao receber o relato mais aguardado por todos: o da dona Jaudete Gomes Soares, de 72 anos, que voltou às salas de aula este ano. “Ela me pediu na carta para nunca fazer o que ela fez, que foi abandonar os estudos para trabalhar. Também me convidou para a formatura dela no EJA daqui dois anos. Quero muito ir. Mas antes quero conhecer ela”, revela Eduarda, imaginando ser sua interlocutora uma pessoa de cabelos “bem branquinhos.” Dona Jaudete, que antes de iniciar na EJA até sabia ler, mas tinha dificuldades em fazer de forma contínua, assim como escrever, se mostra entusiasmada. “Estou muito feliz.”
Bruna Baierler Alves (11) recebeu, junto da sua carta, chaveiros de gatinhos de crochê confeccionados pela nova amiga. “Adorei. É muito lindo. Agora preciso pensar em alguma coisa para presentar ela também quando a gente se conhecer”, diz a menina, sem revelar o nome. E Mickael Ayres (11) vê muitos gostos em comum com o seu interlocutor. “Ele disse que gosta de cavalos. Mandou uma foto onde está montado em um e com a bandeira do Rio Grande do Sul. Também gosto muito disto. Vamos trocar umas ideias”, planeja o garoto. As cartas foram respondidas no mesmo dia.
O encontro
As turmas envolvidas no projeto irão se encontrar em breve. Isto se dará junto da Feira do Conhecimento da Arnaldo José Diel, agendada para o dia 18, quando a comunidade escolar tem a oportunidade de interagir com os alunos sobre os trabalhos desenvolvidos com eles ao longo do ano letivo. Os alunos já preparam surpresas para os aguardados visitantes, inclusive da EJA.
Segundo Gisele, o projeto tem vários propósitos sociais e pedagógicos. “Entre os quais, com o resgaste de uma tradição, fazer com que pessoas conheçam outras realidades sociais, que se mostram bem distintas nos dois grupos, e também estimularmos a escrita, o que de certa forma é pouco praticada hoje em dia com a utilização das mídias sociais”, explica. A escolha das cartas foi planejada. “Com as cartas se tem a preocupação maior com a escrita de verbos e pontuações corretas, uso de palavras não abreviadas como ‘pq’ ou gírias como ‘ok’, que ocorre muito com o uso da internet e aplicativos.” A coordenadora do EJA, Malgarete Cattani, ressalta que a curiosidade que surge por não se saber com quem e como é a vida da pessoa que se está trocando as cartas é um motivador neste caso. “Por ser este interlocutor alguém desconhecido há um cuidado, uma dedicação ainda maior com o que se vai escrever, contar, o que se mostra diferente do que quando pedimos que se escreva uma carta para um amigo ou familiar”, detalha. “Outro motivo é fazer com que estas cartas sejam uma lembrança desta experiência possível de serem guardadas, ao contrário do que fazemos na maioria das vezes com mensagens e fotos virtuais do dia a dia”, completa.
Texto: Rodrigo Angeli
Assessoria de Imprensa Prefeitura de Estrela